Talvez,
senhores, pensem que enlouqueci. Permitam-me fazer uma ressalva. Concordo: o
homem é um animal predominantemente construtivo, destinado ao esforço
consciente em direção a um objetivo e dedicado à arte da engenharia, quer
dizer, à eterna e incessante construção de uma estrada — não
importa para onde ela vá. E que o ponto principal não é para
onde ela vai, mas que
vá para algum lugar, e que uma criança comportada, mesmo que deteste a
profissão de engenheiro, não deve se render àquela desastrosa indolência que,
como se sabe, é a mãe de todos os vícios.
O homem ama a construção e a abertura de estradas, isso é
indisputável. Mas como explicar que ele seja tão apaixonadamente propenso à
destruição e ao caos? Digam-me!
Sobre esse assunto tenho algo a dizer, ainda que breve. Não será
seu apego apaixonado à destruição e ao caos uma consequência do seu medo
instintivo de alcançar o objetivo e completar a obra em construção? […] Mas o
homem é uma criatura volúvel e de reputação duvidosa e, talvez, como um
enxadrista, esteja mais interessado em perseguir um objetivo do que no objetivo
em si. E, quem sabe (ninguém pode ter certeza), talvez o único propósito do
homem neste mundo consista no processo contínuo de perseguir um objetivo ou, em
outras palavras, de viver, e não propriamente no objetivo, que, é claro, tem de
ser algo como duas vezes dois são quatro, ou seja, uma fórmula, algo que,
afinal, não é a vida, mas o princípio da morte.
Fiodor (fabuloso) Dostoievski, desde 1864 ensinando sobre o Mal-estar na Cultura, o dualismo pulsional e o desejo inconsciente.